Número de exames diagnósticos do câncer de colo de útero reduz durante a pandemia no Brasil, aponta Febrasgo
O próximo 26 de março é lembrado como o Dia Mundial da Prevenção do Câncer de Colo do Útero. Dados do Instituto Nacional de Câncer (Inca) informam que esse tipo de tumor é o terceiro mais incidente entre mulheres no Brasil, atrás apenas do câncer de pele não melanoma e do câncer de mama. Apesar de altamente prevenível, o enfrentamento da doença tem desafios, como a baixa taxa de vacinação contra o HPV (Vírus do Papiloma Humano), seu agente causador, e a queda nos diagnósticos devido à pandemia da Covid-19, e tem preocupado especialistas quanto ao aumento nos óbitos.
O Inca estima que, anualmente, sejam diagnosticados 16.710 novos casos de câncer de colo do útero, com uma prevalência de morte em aproximadamente 39,5% dos casos, segundo dados mais atuais, de 2019. Com isso, a doença é a segunda causa de morte por tumores na população feminina, havendo mais óbitos somente entre diagnosticadas com câncer de mama. De 2008 a 2018, a taxa de mortalidade saltou 33%, resultando em uma vítima a cada 90 minutos, segundo dados do Ministério da Saúde.
Especialistas da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) explicam que entre os obstáculos para o combate ao câncer de colo de útero no Brasil estão o elevado número de mulheres que não realizam exames preventivos periodicamente, a escassez de centros especializados no tratamento do câncer e a reduzida cobertura da vacinação contra o HPV.
A pandemia da Covid-19 também influenciou na baixa no número de diagnósticos, visto que muitas consultas precisaram ser canceladas ou reagendadas. Além disso, o presidente da Febrasgo, o Dr. Agnaldo Lopes, acrescenta que aspectos sociais, como a baixa escolaridade e marcadores de raça-etnia tornam-se indicadores que revelavam as diferenças no acesso a medidas preventivas e ao diagnóstico precoce.
“O SUS atende mais de 75% dos pacientes com câncer no país. Para além do diagnóstico, temos o desafio do início do tratamento. Antes da pandemia, o período entre o diagnóstico e o primeiro tratamento durava mais de 60 dias, em 58% dos casos. Hoje esse tempo de espera pode ser bem maior. Devido a fatores como esses, quase nove em cada dez óbitos por câncer do colo do útero, por exemplo, ocorrem em regiões menos desenvolvidas”, diz Lopes.
Queda no número de exames – Em uma busca no Sistema de Informação do Câncer (SISCAN) foi identificado que, enquanto em 2019, ano em que começou a pandemia da Covid-19, foram realizados quase 6,5 milhões de exames citopatológicos – um dos exames solicitados segundo as diretrizes para diagnóstico do câncer de colo do útero – entre pessoas do sexo feminino de todas as idades no Brasil, em 2020, o número de solicitações desse exame caiu cerca de 43% e, em 2021, reduziu em torno de 11%.
Em relação a 2019, quase todos os Estados e o Distrito Federal tiveram queda nas solicitações do exame citopatológico em 2020 e uma recuperação no número de pedidos em 2021. Somente os Estados do Amazonas, do Rio de Janeiro e de Sergipe tiveram mais solicitações do exame em 2021 em comparação a 2019, conforme tabela no final do texto.
A prevenção também é importante – Além do diagnóstico precoce, a ginecologista Dra. Walquíria Quida Salles Pereira Primo, presidente da Comissão Nacional Especializada em Ginecologia Oncológica da Febrasgo, explica que a forma mais eficaz de prevenção do câncer de colo de útero se dá por meio da vacinação contra o HPV. A vacina distribuída gratuitamente pelo SUS, de acordo com a especialista, protege contra quatro tipos do vírus: 6, 11, 16 e 18 — sendo os dois últimos relacionados a 70% dos casos de câncer de útero. Mas a cobertura vacinal para o HPV no país ainda fica aquém do desejado.
“A Febrasgo tem defendido que para uma ação efetiva, a cobertura vacinal seja de 90%. Hoje é de 46%”. A especialista complementa que a vacina contra HPV deve, em um cenário ideal, ser ministrada em três doses para completa ação protetiva, porém duas doses têm se mostrado suficientes. Segundo ela, seria importante que todas elas fossem aplicadas nas escolas.
“Hoje, para tomar a última dose da vacina, é necessário procurar uma unidade de saúde. Mas é importante irmos até os jovens para garantir essa prevenção. E as escolas poderiam ser esse local”, sugere Pereira Primo. Mulheres de nove a 45 anos podem se vacinar contra o HPV. Para os homens, indica-se que a prevenção ocorra até os 26 anos. Quanto mais precocemente ocorrer, maior o potencial de a proteção ocorrer antes que a pessoa tenha contato com o vírus.
A dificuldade de acesso ou a falta de hábito de se consultar regularmente com profissionais de ginecologia é outro entrave à prevenção, identificação e, consequente, tratamento do câncer de colo do útero. Pesquisa da Febrasgo, realizada em 2018, revelou que 13% das mulheres, com mais de 16 anos, nunca foram ou não costumam ir ao ginecologista. Outro dado que incide negativamente no combate à doença aponta que 60% da população feminina chega, pela primeira vez, ao consultório do ginecologista com cerca de 20 anos de idade em decorrência de algum problema instalado, por suspeita de gravidez ou por já estar grávida.
Para Pereira Primo, uma forma de incentivar a procura por acompanhamento médico preventivo seria atrelá-lo a programas sociais do governo: “A maioria das mulheres não realiza o exame de prevenção do câncer de colo de útero, o Papanicolau. Ao colocá-lo como uma das contrapartidas de acesso a esses programas, poderemos ter mais condições de promover um rastreamento da doença, além de orientar e ajudar a prevenir outras patologias”. (Agência)